Normalmente eu tento não fazer dos meus post um diario lamechas, pelo que costumo escrever ou citar coisas que me passam pela cabeça no momento mas este post vai ser diferente, vai ser um desabafo.
Quando eu soube os meus resultados no primeiro semestre depois de todo o sacrificio que fiz o meu pensamento foi: a minha vida acabou.
Deixei-me explicar antes de acharem que eu estou a ser dramatica.
Pondo já de parte o quão inesperado esta situação foi, devido ao bons resultados que fui recebendo ao longo do ano incentivando-me de que estava a fazer um bom trabalho, e o facto que ISTO É O MEU OBJECTIVO DE VIDA há mais.
Primeiro ponto: Eu sempre me senti desajustada das pessoas que me rodeavam (eu sei que a maioria das criançãs/adolescentes/jovens adultos se sentem assim mas não sabem verdadeiramente o que é sentir-se desajustado). Tu senteste desajustada quando descobres aquilo que mais te tras alegria e não tens ninguém que perceba porque é que te sentes alegre. Tu senteste desajustada quando tens vergonha de admitir mesmo às pessoas mais proximas que gostas de estudar determinadas materias durante horas, tu senteste desajustada quando explicas que trabalhas durante um ano inteiro todos os dias das 8h da manhã as 21h da noite e as pessoas te respondem "não sei como é que consegues" e ainda te sentes mais desajustada quando depois de todas essas horas a estudar tu sais da biblioteca e vais a cantar em silêncio e quase a dançar no meio da rua ou das escadas ou em casa (ou nas 3 de forma sequencial), porque estás FELIZ, porque apesar de os teus olhos estarem vermelhos de tanto ler, de o teu braço se queixar de tanto escrever, e de não teres forças sequer para te por dentro da banheira, tu estas feliz porque te sentes REALIZADA, porque: "ok eu toda a vida fui uma desajustada mas agora ja não".
Agora as pessoas do meu dia a dia percebem que se me acaba um stabilo a meio do estudo é caso para o ir comprar a correr e voltar para a bilbioteca; que, sim eu ponho tampões a estudar mas isso não permite que as pessoas ao meu lado estejam a falar, que encontrar um resumo optimo de uma materia que me vai permitir perder menos 2h quando for o momento de a ir reler é caso para o meu dia me ter corrido bem, pessoas que percebem perfeitamente o quão levantar-me 20 min depois da hora que era suposto ir para a biblioteca pode prejudicar o meu dia (fico sem lugar na biblioteca e o dia torna-se menos produtivo) pessoas que conhecem o alivio de baixar a cabeça 5 min na biblioteca e fechar os olhos, pessoas que eu não conheço assim tão bem, que não são muito importantes mas que compreendem mais do que qualquer amigo ou familiar.
Encontrares finalmente o teu lugar e depois tirarem-te o tapete é terrivel... terrivel mesmo...
Segundo ponto: eu passei 3 anos numa relação com alguém que não tinha de todo uma maneira de estar na vida compatível com a minha. Foi bom, aprendi muito, aprendi sobretudo aquilo que quero.
Depois desses 3 anos (já la vão 4 anos o que dá um total de 7) tive variados pertendentes a tentar mudar esta situação (sem querer ser convencida ou qualquer coisa do estilo, uns bons outros menos bons, mas foram alguns pertendentes) a questão foi:
- Primeiro estava no 12º ano e não queria atrapalhar o meu último ano de secondario visto que as medias eram muito importantes;
- Depois o primeiro ano de universidade em lisboa, entre estudar para exames de universidade (e trabalhos, carradas de trabalhos) para exames espanhois, tirar a carta, a seguir vieram as aulas de francês todos os dias com a enorme quantidade de trabalhos que estas implicavam (porque o meu exame era num mês e eu tinha de ter um nível bom o suficiente para ser aceite) não esquecendo todas as coisas necessarias do dia-a-dia porque existiam animais e uma mãe que passava o dia a trabalhar e amigos que podiam contar comigo para eu ir a correr quando o namorado/a ou os pais a(s)/o(s) chateavam, acho que me fiz entender, ou seja o tempo e a paciência eram escassos para me por no quer que fosse a ver o quer que poderia dar e também eu ia-me embora, era a pior altura para me por numa relação com quem quer fosse;
- Nisto já la iam 2 anos, temos então o primeiro ano de concours de medicina, passar o dia-a-dia fechada numa biblioteca começas a te aperceber que o ponto alto da tua vida amorosa é quando um rapaz te sorri enquanto estas a espera para entrares na casa de banho, ou quando olha fixamente para ti ou quando te vem fazer uma pergunta ridicula do estilo "estamos em que parte da materia do cours?" e a expressão " et bas je te fait la bise" passa a ser o teu novo "posso ficar com o teu numero de telemovel? ou queres ir ao cinema?" Ainda assim devido ao meu primeiro ponto estas situações são mais engraçadas que tristes o "podes me ver se ninguem me tira o lugar vou so buscar um café" passa a ser o teu novo Ola acho te interessante, estamos na mesma mesa podemos falar? E trocar sorrisos? (é como se estivessemos na creche).
Antes de falar do segundo ano cá, acho que está mais que percebido que nenhum destes pretendentes me conseguiu prender, ou porque se esforcavam demasiado ou nao percebiam ironia ou porque apresentavam um nivel baixo de QI (sem querer ser má mas passares a noite a ouvir um rapaz elogiar cada particularidade da tua pessoa, não é romântico, é simplesmente cansativo) ou porque físicamente não me atraiam.
- E eis que, no segundo ano francês eu desenvolvo uma especie de sentimento estranho, que só compreendi o que era quando pensei a minha vida acabou, por um rapaz que me acompanhou em praticamente todas as minhas viagens de tram de manhã e nas noites depois do tutorat, que me acompanhou todos os dias de tutorat e que este ano (sabe-se lá como) voltou a ficar no meu grupo de tutorat. Este rapaz inteligente (150 no concours), independente, focado, simpatico, divertido, não arrogante nem convencido, calmo e muito muito bonito, que passou a estar sentado todos os dias na biblioteca a duas mesas de mim e (em raras excepções mesmo ao meu lado) este rapaz que consegue chegar ao mesmo tempo que eu a porta da biblioteca, este rapaz que cada vez que entrava nas aulas do tutorat ou na biblioteca cruzava os meus olhos, este rapaz que corresponde a tudo aquilo que eu sempre procurei. E agora voltamos ao assunto do desespero, desespero porque nunca fiz mais que baixar o olhar e sorrir, porque ele era bom ele ia passar o concours de medicina e eu, eu era boa, e eu ia passar o concours de medicina e disse a mim propria nos momentos em que o meu juízo ficava toldado por aquele azul ou aquele sorriso "para o ano Raquel" a minha vida ia começar para o ano, por fim todo o sacrificio ia pagar todos os anos de desajustada iam ser lembranças remotas e os dias de chegar a casa a cantar iam tornar-se permanentes, e eu ia finalmente estar feliz, feliz com a minha vida. "P'ro ano..."
Eu sou humana, e por isso obviamente tenho sentimentos que eu sei que não são o melhor o para mim e que eu sei que se os seguir vou arrepender-me mais tarde, por isso forço-me, mesmo que eu saiba que vai ser duro, a pôr os sentimentos de parte e a fazer o melhor para o meu futuro, e o melhor para o meu futuro não era ficar por França a fingir que ainda ia conseguir passar o concours este ano, eu sabia que tinha de ter mais hipoteses e por isso além de me preparar para os exames franceses, preparei-me para exames espanhois e portugueses (com a sorte que tenho nenhum vai resultar), voltei a portugal com a tristeza toda que isso me trouxe (não me intrepetem mal, eu adoro o meu país mas já me tinha despedido, já tinha chorado, já me tinha habituada e voltar, é como se eu estivesse a regredir, mas em termos de estudos é onde eu tenho mais hipoteses de fazer qualquer curso) e pensei agora não vou ver o rapaz e isto vai passar.
Mais pertendentes vieram e eu pensei "porra", porra porque já nem um rapaz bonitinho numa discoteca me conseguia fazer esquecer os olhos deles nos meus, porra porque eu já estou no ponto de "agora já sei o que quero, já não quero outra coisa".
Voltei para bordeaux para me preparar para os exames franceses e cada vez que tinha de sair de casa por algum motivo de força maior os meus olhos procuravam-no no tram qu tantas vezes apanhamos juntos, mesmo eu sabendo onde é que ele estava naquele preciso momento (biblioteca). Milhares foram as noites em que me deitei a pensar amanha vou estuda para a biblioteca, mas porque aquele sitio me trás boas recordações, recordações do tempo em que eu estava realizada, e recordações de como isso me escapou pela mão e sobretudo porque não sabia qual ia ser a minha reacção àqueles olhos azuis. Então como uma rapariga focada fiquei por casa e evitei quaisqueres pensamentos que me levassem para essa fase da minha vida essa fase de "finalmente a minha vida vai começar".
Terceiro e ultimo ponto (este post esta longuissimo espero que tenham paciencia para o ler todo^^): A semana do concours. No domingo à noite antes de dormir a minha mente mudava de "espero não o ver esta semana" para "quero vê lo esta semana de qualquer forma não o ver ja se percebeu que não ajuda" para "de certeza que não o vou ver, não o vi no primeiro semestre, no concours nunca se encontra ninguem conhecido a menos que seja por telemovel, em 3000 e tal pessoas o grupo de 6 pessoas que conheces não tem relevância nenhuma". No primeiro dia do concours vai se la perceber como, quando estava sentada a rever os ultimos detalhes para o exame de anatomia eis que ele decide literalmente (pelo menos na minha cabeça de pessoa mudada com sentimos diferentes) deslizar a minha frente, sozinho e encostar-se a uma arvore no meu campo de visão a ler o seu poli de anat.
E mais uma vez desesperante, desesperante porque durante o resto da semana os meus dias vão ser um lembrar constante de tudo o que perdi, um lembrar constante de que houve pessoas que conseguiram aquilo pelo o qual eu tanto trabalhei, um lembrar constante desta situação desperante e injusta a tantos niveis, e a expressão "primants de merde, jamais tu l'auras" passa a aplicar-se a ti, mesmo se tu não és primante, mesmo se não havia nada de diferente que podesses ter feito, mesmo se a situação que te encontras é um manque de chance.
Desesperante, e do nada a tua vida não tem sentido e mais uma vez voltas a estaca zero, mais uma vez tens de forçar te a esquecer os sentimentos e em te manteres focada.
Desesperante porque nada do que os outros dizem ou fazem pode mudar o que sentes, deseperante porque eles sabem que eu tenho razão, desesperante porque nem eles sabem o que dizer ou fazer, desesperante porque voltas a ser uma desajustada mas desta vez com o conhecimento do sentimento de ajustamento, desesperante porque isto é o meu sonho, desesperante porque a minha vida se resume a um manque de chance.
Deixo-vos parte da letra que resume a força que se tem quando nos sentimos realizado, por mais cansativo que isso seja:
Every day I fight for all my future somethings
A thousand little wars I have to choose between
I could spend a lifetime earning things that I don't need
But that's like chasing rainbows and coming home empty
And if you strip me, strip it all away
If you strip me, what would you find
If you strip me, strip it all away
I'll be all right
Take what you want, steal my pride
Build me up or cut me down to size
Shut me out, but I'll just scream
I'm only one voice in a million
But you ain't taking that from me
"Strip me"
Natasha Bedingfield
